quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

O Diário de Eva (fragmentos) — Mark Twain

Diário de Eva


DOMINGO DA SEMANA SEGUINTE

Durante toda a semana eu fiquei ao redor dele e tentei estabelecer relações. Tive que conversar sozinha, porque ele se sentiu intimidado, mas não me importei com isso. Ele parecia feliz de me ter por perto, e eu usei o sociável "nós” por um bom tempo, porque ele parecia ficar lisonjeado ao ser incluído.

QUARTA-FEIRA

Estamos nos dando muito bem, de fato, agora, e nos conhecendo cada vez melhor. Ele já não tenta me evitar, o que é um bom sinal, e demonstra que gosta de que eu esteja por perto. Isto me agrada, e eu estudo como ser útil para ele de todas as maneiras que puder, para assim aumentar a sua atenção. Durante os últimos dois dias eu tirei de seus ombros todo o trabalho de dar nome às coisas, e foi um grande alívio para ele, pois ele não tem talento para tanto e está evidentemente muito agradecido. Ele não consegue pensar num único nome racional para salvar sua reputação, mas não o deixo perceber que estou consciente deste seu defeito. Sempre que uma nova criatura aparece, eu lhe dou um nome antes que ele tenha tempo de se expor através de um silêncio constrangedor. Desta forma, evito que ele tenha muitos momentos de embaraço. Não tenho este tipo de defeito. No minuto em que deito os olhos num animal, sei o que é. Não preciso refletir nem por um momento; o nome certo surge instantaneamente, como se fosse uma inspiração, como de fato deve ser, sem dúvida, pois tenho certeza de que o nome não estava comigo nem meio minuto antes. Pareço saber, somente pela forma da criatura e pelo seu jeito de agir, que animal é.

Quando o dodô apareceu, ele pensou que se tratava de um gato selvagem — vi em seus olhos. Mas eu o salvei. E tive o cuidado de não o fazer de uma forma que pudesse ferir seu orgulho. Simplesmente falei de modo bastante natural, com alegre surpresa, e nem de longe deixei transparecer que estava lhe dando uma informação, e disse: “Ora essa!, se isto não é um dodô!”, e expliquei-lhe, sem parecer que estava explicando, como sabia que era um dodô. E, embora eu tenha reparado que talvez ele suspeitasse um pouco de que eu já conhecia aquela criatura, ficou bastante evidente que ele me admirava. Foi muito agradável, e pensei sobre isso mais de uma vez com satisfação antes de dormir. Como uma coisa tão pequena pode nos deixar felizes quando sentimos que a merecemos!

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